terça-feira, 7 de maio de 2013

Eu e a criminalidade

Posicionar-se sobre certos assuntos polêmicos sempre gera desgaste. Você pensa sobre o assunto, ouve opiniões diversas (sejam elas fundamentadas ou não), lê a respeito, tenta não ser ignorante ou refratária, mas num dado momento, sempre chegamos a um impasse. Hoje ao saber que o estuprador do ônibus era menor de idade, por um minuto meu sangue ferveu, e desejei impensadamente que pudéssemos encarcerar todo menor infrator por tempo indeterminado, mas depois voltei à razão.

Quando o assunto é criminalidade e tudo que envolve esse tema direta ou indiretamente, fica ainda mais difícil tratar o assunto com alguma racionalidade. É comum deparar com frases como "bandido bom é bandido morto", "criminoso não deveria ter direitos humanos", "tem mais é que matar mesmo", "na época da ditadura não era desse jeito"... Assim como há o extremo oposto, que conclui que todo criminoso na verdade é uma vítima da sociedade e sua reintegração deve ocorrer a todo custo.

Discutir sobre criminalidade é difícil, quase impossível. Embora o assunto envolva vários tipos de delitos, vários tipos de criminosos, a tendência é que se coloque todo mundo, maior ou menor de idade, num mesmo pacote de malandros vida fácil que tomam posse violentamente dos bens que o "cidadão direito" conquistou a duras penas. Por isso, todos merecem uma bala no meio da testa, sem direito a julgamento. Parece dramático e exagerado, mas é mais ou menos por aí que pensa a maioria. O mesmo vale para a redução da maioridade penal, ou para a pena de morte.

Um código penal frágil e paternalista tem nos tornado reféns de toda sorte de criminoso, e de várias más condutas: não há terreno mais fértil para o crescimento de movimentos milicianos apoiados silenciosamente pela sociedade, que um país onde um menor que queima viva uma dentista é solto meses depois do crime por ter apenas 17 anos, ou onde 80% dos casos de homicídios e latrocínios não são solucionados. Aos olhos de muitos, o que milicianos e policiais que protagonizam "resistência seguida de morte" aos litros estão fazendo, é um "serviço de utilidade pública", de "limpeza", "higiene social". Me lembra uma música feita para despertar o horror: Grupo de Extermínio de Aberrações. O que se faz é avalizar exatamente o que é relatado por ela.

Eu, particularmente, vejo na redução da maioridade penal mais um problema que uma solução. Somos uma sociedade que não reintegra ex-presidiários, por mais que (acreditem!) alguns deles se recuperem e tentem deixar a vida de ilicitudes após deixar a prisão, nós, as sempre vítimas, muitas vezes não lhes damos oportunidade. Hoje como estamos, ao menos os jovens que num dado momento da vida se perdem mas ainda são "recuperáveis" mantém suas fichas limpas ao completarem 18 anos, e podem ingressar no mercado de trabalho sem sofrerem o estigma de um dia ter sido condenado por um crime qualquer.

Ainda assim, entendo que há casos e casos, como o de menores que cometem latrocínio, estupros, e outros crimes hediondos e típicos de quem é desprovido de humanidade ou mesmo sanidade mental. Não são maioria, mas existem. O que fazer com eles, então? Abrir a possibilidade de processar como adulto um menor que comete um crime realmente grave, seria muito mais razoável que simplesmente nivelar por baixo. Não sei os termos exatos, mas é assim na legislação norte americana, por exemplo: independendo da idade, um menor pode ser julgado como adulto conforme a gravidade do delito. Alguns Estados adotam a maioridade a partir dos 16, outros a partir de 21. Em todos eles há a possibilidade de se julgar um menor como adulto, a depender do entendimento do Judiciário.

O sistema de justiça americano é  um bom caso de estudo sobre porque não reduzir a maioridade penal, ao contrário do que dizem uns nas redes sociais. Excetuando-se crimes bárbaros, a maioria absoluta dos jovens condenados são enviados a sistemas correcionais voltados para reabilitação, educação e tratamento médico, ao contrário do encarceramento tão desejado pelos brasileiros. Isso porque vários estudos indicam que nessa idade o encarceramento é pouco efetivo e benéfico para a sociedade, e um jovem encarcerado tende a voltar à criminalidade, enquanto um jovem submetido a um tratamento de reabilitação social e psicológica tem altas probabilidades de se reintegrar à sociedade sem reincidências. Talvez isso tenha a ver com o eterno conflito entre carência e revolta que faz parte da adolescência, não sei... De toda forma essa flexibilidade e discernimento entre pequenos delitos e crimes realmente graves presente na legislação americana, aponta o caminho ao resto do mundo sobre como proceder quanto à criminalidade juvenil.

Outro assunto delicado, mas não menos relevante, é o porte de arma por civis. Entendo quem se posiciona de forma contrária, mas acredito que permitir a civis portar armas, desde que devidamente habilitados, não é um fator de risco para a sociedade. O Brasil já teve porte de arma concedido a civis, e a criminalidade era muito menor tanto em números relativos quanto absolutos. A parcela populacional que se sente mais segura com o Estatuto do Desarmamento, é justamente a dos criminosos: como um assaltante controlaria um ônibus, restaurante, ou qualquer aglomeração com mais de quinze pessoas, quando sabe que ao menos um presente poder estar armado e reagir? 

Sou favorável ao porte de armas por civis porque o 190 não previne crimes. Delegacias não protegem cidadãos de forma proativa, apenas age (quando age) para deter quem violou o direito alheio. Uma viatura policial raramente chega a tempo de deter o criminoso no local do crime. Temos falta de contingente policial, um sistema de justiça deficiente, e muitos criminosos explorando todas as brechas abertas, inclusive a população civil desarmada.

Mais uma questão sensível quando se trata de criminalidade, é a pena de morte. Defensores dos direitos humanos tem horror ao assunto. Eu, embora acredite na necessidade de preservar a dignidade humana independente de se tratar da população livre ou encarcerada, entendo que a pena de morte é não apenas possível, mas necessária. Entendo que a reclusão é um caminho adequado para um indivíduo que tem potencial para ser reabilitado, reintegrado à sociedade após cumprir sua pena. 

Por outro lado, precisamos admitir que nem todo criminoso pode ser reabilitado.  Há mesmo alguns não merecem ser reabilitados, mesmo que dotados de plenas faculdades mentais. Um Cabo Bruno da vida, que mata mais de cinquenta pessoas, merecia uma injeção letal, ou até uma cadeira elétrica, em minha opinião. O mesmo vale para o Maniaco da Cruz, ou para grandes traficantes de drogas, responsáveis por movimentar bilhões de dólares, colaborar com a escalada da criminalidade em comunidades carentes, degradação da vida humana, tráfico de armas, pessoas, lavagem de dinheiro.... Pessoas assim não tem recuperação. Há crimes graves o suficiente para que o indivíduo pague com a própria vida, e precisamos encarar e aceitar isso.

Há quem me considere incoerente, porque sou favorável à pena de morte, contrária à redução absoluta da maioridade penal, favorável à melhoria das condições de vida dos presidiários, favorável ao julgamento de adolescentes como adultos em crimes hediondos, punição extremada a milicanos... 

Não vejo incoerência alguma em um ponto de vista não-extremado sobre assuntos que afetam absolutamente todo e qualquer brasileiro. Ao contrário, considero incoerente o estado de negação em que muitos de nós submergimos ao tratar de temas delicados, como a existência de abominações caminhando entre nós, ou de uma parcela de praticantes de delitos que realmente é formada por vítimas das desigualdades sociais. Existem vários tipos de criminosos, e por isso precisamos de vários tipos de punições, de detenção juvenil para reabilitação à pena de morte.

Em um mundo em que não saímos todos da mesma forminha, e não crescemos todos no mesmo contexto, a busca pela justiça exige flexibilidade e ponderação.

quinta-feira, 7 de março de 2013

A Esquerda, a Direita, e o que realmente importa


Pessoas são realmente intrigantes.

Achei muito interessante os protestos contra Yoani Sanchéz, e como muita gente entrou no Facebook para falar sobre isso, como ela era uma traidora e quem discorda é desinformado sobre a realidade. Novamente, os ânimos na minha timeline se exacerbaram quando o venezuelano Hugo Chávez faleceu, conforme era de se prever. 

Acho particularmente curiosos os diversos casos de frequentadores de Tok&Stock, Outlet Premium, Dom Francisco e Saborella protestando com veemência e aparente convicção contra todos os porcos direitistas que supostamente estariam celebrando a morte de Chavéz, uma liderança carismática que graças às frágeis estruturas democráticas e maturidade política de seu país, conseguiu ser presidente por quatorze anos, e o seria por muito mais tempo se continuasse vivo. 

Particularmente, não torci contra ou a favor da vida do político. Não acredito em torcidas nesses casos, nem em termos de eficiência, ou por acreditar que o que representa um indivíduo morre com ele. Ideologias sobrevivem a "mártires", e muitas vezes se fortalecem após eles. É assim a séculos e séculos. 

Uma das coisas que nos separa dos macacos, é nossa capacidade gigantesca de criar rótulos. Gostamos de colocar pessoas em caixinhas, e esperar que elas fiquem sempre dentro delas. Quando alguém insiste em sair dessa caixinha, o imperativo coletivo insiste em colocá-lo dentro de outra caixa. 

Como se pessoas não pudessem circular livremente e inteligentemente entre correntes diversas de pensamento. Como se isso fosse um ato de rebeldia, e por si só, a fundação de uma nova corrente. Nós estabelecemos que o indivíduo não pode pensar individualmente ao observar o coletivo. Entendem o que quero dizer?

Aí chegamos a esse ponto: abraçamos uma ideologia teórica, e uma vida prática totalmente diferente. Nos tornamos hipócritas e recusamos a enxergar que, na verdade, existem acertos e erros por todos os lados. Nos recusamos a recusar as caixinhas, e padecemos com isso. Considero recriminável os discursos odiosos que enfrento cada vez que ouso discordar publicamente da obra política geral de Lula, apenas porque para mim a alegada "ruptura" que seus partidários (filiados ou não) afirmam ter existido, em minha opinião nunca existiu. Reconheço muitos acertos, mas não me nego a enxergar inúmeros erros, mesmo nos acertos.

Ao contrário do que muitos pensam, eu acredito no assistencialismo. Acredito de verdade. Sou favorável a cotas em universidades para egressos do ensino público, a programas como o Bolsa Família. Vejo no assistencialismo brasileiro, venezuelano, e mesmo americano (sim, existe por lá também) a melhor forma de amenizar imediatamente problemas sociais urgentes, muitas vezes crônicos. Entretanto, o assistencialismo sozinho não soluciona o problema ao longo dos anos. Assistencialismo não reduz curvas de aprendizagem, de inclusão social.

A sensibilidade, e não a postura ideológica, deveria levar todo ser humano a compreender a necessidade do assistencialismo. A inteligência, e não a postura ideológica, deveria nos levar a compreender que outras ações, como a mudança na forma de se pensar, gerir e fazer educação, política, saúde e infraestrutura nos libertaria a longo prazo de vários problemas sociais e econômicos.

Eu não consigo levar a sério pessoas que sempre tiveram "tudo" (não um lamborghini, mas educação, alimento, moradia e acesso a informação em geral), e não compreendem a necessidade de subsidiar o mínimo a quem é esmagado diariamente pela dinâmica do mercado, pela falta de oportunidades. 

Da mesma forma, não consigo levar a sério quem usufrui de todos os benefícios supérfluos e consumistas de uma economia livre, de um país democrático, que do alto de seus dispositivos Apple entram no Facebook para criticar a postura anti-governo uma ativista vinda de um país sem nenhum desses privilégios, ou para chamar qualquer um que não partilhe de sua visão romântica do Socialismo de "direitista".

Pessoas carecem de capacidade analítica. Seja para avaliar sua própria vivência, o histórico da humanidade, os resultados catastróficos de implementações práticas de teorias lindas, o que há de bom e útil em uma ou outra corrente de pensamento, e assim por diante. O que importa é brigar e até morrer por um núcleo sólido e falido decidimos num momento abraçar sem analisar todas as suas nuances, todas as suas implicações.

Enquanto prevalecermos assim, pode morrer Che Guevara, Chávez, Allende, Abraham Lincoln, Osama Bin Laden, Kadafi, Kennedy, e todos os 7 bilhões de habitantes desse planeta insignificante. 

Continuaremos perdidos e vítimas de nossa própria ignorância e intransigência.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Los Hermanos, Nós, e o Big Brother

democracia
[Do gr. demokratía.]
Substantivo feminino.
1.Governo do povo; soberania popular; democratismo. [Cf. vulgocracia.]
2.Doutrina ou regime político baseado nos princípios da soberania popular e da distribuição eqüitativa do poder, ou seja, regime de governo que se caracteriza, em essência, pela liberdade do ato eleitoral, pela divisão dos poderes e pelo controle da autoridade, i. e., dos poderes de decisão e de execução;
  • Democracia autoritária. 1. Ciênc. Pol. Sistema de governo surgido após a 1a Guerra Mundial, em geral anticomunista, firmado na supremacia do poder executivo em relação aos demais poderes.
  • Democracia popular. 1. Ciênc. Pol. Designação comum aos regimes políticos monopartidários dominantes nos países da área socialista. [Cf., nesta acepç., república popular.]
 (Dicionário Aurélio)

 Eu sou uma pessoa democrática, conforme a segunda definição apresentada pelo respeitado dicionário. Entretanto, conforme o próprio dicionário nos clarifica, existem por aí outros regimes que se auto-denominam democráticos, ainda que o poder não esteja distribuído eqüitativamente, ou que seja um regime monopartidário, excluindo assim a liberdade do ato eleitoral.
Se auto-denominar democrático é muito simples, fácil. Como se auto-denominar honesto, inocente, ficha-limpa, ignorante de cercas coisas, etc. A política brasileira não me deixa mentir.

Dois Continentes acima, num certo país, um jornal localizado em Cidad Juarez publicou um editorial no qual pergunta ao narcotráfico mexicano: O que vocês querem que nós publiquemos? Cabeças rolaram (literalmente) por lá, pela simples citação de nomes de alguns chefões do tráfico de entorpecentes. 

Enquanto isso, ao sudoeste do país, a distinta, isentíssima, ilibada, honrada, senhora de família e presidente da Argentina Kristina Kirchner está sedenta por sangue: quer a prisão dos donos dos jornais Clarín e La Nación, pelo assassinato de um homem que morreu num acidente de avião (!). Já que não consegue fechar as portas dos jornais, considerando os fatos do México, e a despeito da diferença de periculosidade existente entre narcotráfico e corrupção, talvez a presidente dotada de tanta hombredad também tenha se achado em condições de ameaçar alguém, ainda que não inspire o mesmo medo e não possa sair por aí promovendo matança de jornalistas.
Ao mesmo tempo, na terra de Macunaíma, o sr. Luiz Inácio quase baba de fúria ao se referir aos jornais que insistem em fazer diferente da Carta Capital, e dão algum espaço às recorrentes denúncias de corrupção, fraude e má administração pública ocorridas embaixo do excelentíssimo nariz presidencial. Não sei bem que os Kirchners fizeram escola com Luiz Inácio ou se foi o contrário. O curioso é o brasileiro continuar se achando tão diferente e melhor que o argentino.

George Orwell, crítico de diversos regimes e escritor de grande talento, descreve em sua obra 1984 um regime opressor, sustentado pela propaganda estatal, e balisado pelo Ministério da Verdade - o único órgão responsável pelo trato e divulgação de informações do país fictício. Tudo convergia para a perpetuação do poder do Grande Irmão.

Ainda que escrito de forma crítica, 1984 retrata o desejo íntimo de todo falso democrata que ascende ao poder. José Dirceu, num ato falho, declarou em uma palestra que "O problema do Brasil é o excesso da liberdade de imprensa". Estrago feito, disse que foi mal interpretado. 

Entre Kirchners, Silvas, Chávez e outros, percebe-se que, na falta de respaldo público para agir como o narcotráfico mexicano, que simplesmente extermina quem ousa publicar o inconveniente, na América do Sul prega-se a distorção visando o descrédito: criam-se termos como factóide, golpismo midiático, PiG, denuncismo, tapetão...

A América do Sul se estagnou em 1984, governada por camaradas, num regime de camaradagens.
Estamos a caminho da Democracia Popular... e eu me recuso a seguir por esse caminho.